"Só uso a palavra para compor meus silêncios"

Manoel de Barros


Eu só tenho usado o silêncio para compor os meus gritos...


Este é pura e simplesmente um espaço na mídia para divulgar meus poemas, contos, crônicas e artigos de opinião, bem como dos meus mestres e mestras da Filosofia e ARTES de um modo geral. Amo ESCREVER, acima de todas as coisas, então faço desse espaço o meu "grito de alerta", sem maiores pretensões...mas sempre com muitas provocações, pois fazem-se necessárias para que não sigamos mansos a trilha da manada direto para o matadouro... Apesar de todas as decepções, eu AINDA creio e amo o ser humano, então vamos lutar todos juntos em UNICIDADE, AMOR E FRATERNIDADE.

sábado, 31 de julho de 2010

SIMPLESMENTE MULHER...


SÓ UMA LINHA

AS CURVAS ABRAÇA

NASCE UMA MULHER

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Zélia Duncan - Milágrimas



Letra>: Alice Ruiz Música: Itamar Assunção


Milágrimas


Em caso de dor ponha gelo
Mude o corte de cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema dê um sorriso
ainda que amarelo,
Esqueça seu cotovelo
Se amargo foi já ter sido
Troque já esse vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada mil lágrimas sai um milagre

Caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa
coma somente a cereja
Jogue para cima faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra penas viva apenas
Sendo só fissura ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena reze um terço
Caia fora do contexto
invente seu endereço
A cada mil lágrimas sai um milagre

Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal do sal do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas três dez cem mil lágrimas sinta o milagre
A cada mil lágrimas sai um milagre

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O PAU por FERNANDA YOUNG


"O nono romance da escritora, roteirista e apresentadora de tv, Fernanda Young, já chama atenção pelo título e pela foto na capa. Intitulado de O Pau, o livro traz através da personagem Adriana toda a relação feminina e também de toda a sociedade com o símbolo máximo da masculinidade, o pau. Através das experiências vividas pela personagem ela questiona esse culto e essa necessidade de afirmação masculina pelo seu órgão genital. Com os pensamentos e argumentos de Adriana fica evidente a relação conflitante entre homens e mulheres. Do quanto uma mulher pode ficar cega por um homem ou quanto um homem é capaz de pensar só com a cabeça de baixo muitas vezes. Todos esses mitos e verdades que envolvem um relacionamento na nossa sociedade moderna.
Fernanda Young consegue traduzir e mapeiar de certa maneira essas tribos e estilos de pessoas que acham e vivem uma vida toda baseada na cultura do belo, da banalização do sexo e da sexualidade. E entre passagens engraçadas e dramáticas fica evidente temas importantes como o preconceito de relacionamentos com grandes diferenças de idade, o aborto, inseguranças com a própria beleza, com a vida e principalmente com o amor. Fica claro no livro que cada vez mais nos julgamos modernos, pra frente e sem encanações com nada, mas no fim estamos todos no mesmo barco furado, na vala comum, cheio de incertezas e inseguranças e em busca de algo cada vez mais raro nos dias de hoje. De achar o príncipe encantado, a garota ideal, que na verdade pode existir ou não. Questões que passam pela confiança, respeito e amor sem as amarras que o mundo moderno nos oferece de bandeja.
Não chega a ser o melhor livro da Fernanda, como por exemplo Vergonha dos pés mas é um livro onde tanto homens e mulheres de alguma maneira vão se ver ou vão ver amigos, parentes, conhecidos e desconhecidos de alguma maneira retratados ali.


Tiago Mistura é radialista e webdesigner. Já fez parte da banda Stella Art (www.myspace.com/stellaart1), que tocava músicas próprias voltadas ao pop rock e hoje escreve para o Mais Palavras (link na barra lateral).

quinta-feira, 22 de julho de 2010

DO SILÊNCIO...


Quero tanto
com poucas palavras
Nenhuma palavra
fazer poesia
de silêncio
Escrever no vento
letras fortes
feitas de pedras
lançá-las longe
jogar fora a inspiração
livrar-me da sina maldita
de ser poeta
desdita
A sina de ser Eu.

Eu quero ser Outra
Eu quero calar!


Pintura: Edvard Munch - O Grito

Sobre esse quadro Munch escreveu nas linhas de seu DIÁRIO:


"Passeava com dois amigos ao pôr-do-sol – o céu ficou de súbito vermelho-sangue – eu parei, exausto, e inclinei-me sobre a mureta– havia sangue e línguas de fogo sobre o azul escuro do fjord e sobre a cidade – os meus amigos continuaram, mas eu fiquei ali a tremer de ansiedade – e senti o grito infinito da Natureza."

Belíssimos HAIKAIS

Consegui este vídeo no lindo blog NOSSO HAIKAI: http://nossohaikai.blogspot.com/

Vale a pena conferir o vídeo e o blog! Sou suspeita pra falar, pois sinto verdadeira adoração por haikai, tal qual sinto pelos origamis, bem como os bonsais e a Filosofia do Oriente (Taoísmo, Budismo, Bhagavad Gita e mais uma infinidade de Conhecimento e Sabedoria) . A Cultura Oriental me encanta profundamente. Espero que também me ENSINE bastante tudo que ainda preciso aprender para evoluir pessoal e espiritualmente.

BEIJOS!!!!! Boas reflexões a todos ao lerem esses belíssimos haikais...

domingo, 18 de julho de 2010

DISPAROU O Tempo E NÓS Também...

Contagem regressiva para mais um aniversário: Só uma semana para 27 de Julho. VEM NI MIM 41!!!!! O TEMPO DISPAROU E ME COME GOSTOSO E EU GOSTO.... sem ruga, sem peito caído, sem hipocrisia na alma e na face. Vai ver é por isso que o tempo me saboreia em 'banho-maria' ou 'banho de gato', às vezes, e me faz gostar e gozar, ser alegre e triste ao mesmo tempo, sem medo e com muito medo de SER e VIVER, mas sem nunca perder de vista quem eu sou de verdade. Por isso, posso até me dar ao luxo de vez em quando não querer ser eu... querer

ME REINVENTAR!!!

O Tempo não para! Ele sabe ser cruel muitas vezes, sobretudo com quem não mostra sua verdadeIra CARA; mas, se pedir com jeitinho e carinho, ele para sim, até nina as horas num balanço doce, aconchegante e quente... te oferece um beijo, um afago, faz um carinho na tua pele, te deixa arrepiada e passa porque é pra isso que ele existe, precisa cumprir sua sina, sua função. Coitado de quem chama o Tempo pra briga. Não... O Tempo você tem que tratar com carinho, ternura, mas sem apego em demasia pelo o que você já foi um dia. O Tempo obriga-nos a desenvolver nossa percepção e criatividade, descobrir novas formas de ver o Mundo e de nos mostrarmos ao Mundo. Chega uma hora que o senso estético da elegância nos proíbe de usar uma minissaia de um palmo, mesmo continuando a ter pernas deliciosas e bem torneadas. É que o Tempo apura nossa estética da necessidade de autoafirmação. Pra que exibir pernas e peitos numa vitrine, tal qual uma bisteca no açougue? Não. Isso é para a juventude e todos os seus medos e inseguranças e sobretudo a vontade de ver e ser visto. Quando chegamos a determinada idade não sentimos mais tanta vontade de exposição; alguns pelo menos. Se bem que nessa Era BBB as lentes nos invadem o tempo todo e nós invadimos as lentes também, não é mesmo? Estar neste exato minuto escrevendo neste blog é uma característica irrefutável dos efeitos dessa Era. A Era de transição para o NOVO AEON - Era de Aquarius - a tão sonhada e almejada conquista do ser humano pela PAZ e HARMONIA de forma absoluta; o respeito à liberdade e individualidade de cada UM e a PLENA CONSCIÊNCIA DA UNICIDADE:

Se você se corta,

Sinto sua Dor.

A maturidade traz muitas conquistas, ainda que a Era de Aquarius não tenha se instaurado em definitivo. Traz perdas? Sim;claro que sim. Todo dia perdemos quem já não somos mais e ganhamos quem desejamos ser. Isso é a suprema CONDIÇÃO DA EXISTÊNCIA HUMANA. Estamos sempre em moblidade, dinamismo, nada se estabiliza nunca, ainda bem. Sinal que estamos vivos. O Ser estável é o Ser Morto! Mesmo que ainda respire e esteja tecnicamente vivo, mas é alguém que na verdade é ninguém, pois não está em busca de nada, pensa que já encontrou tudo. Então, acaba o processo de Evolução. Como que alguém que já é 'TUDO' pode evoluir? Só se for para debaixo da terra.

Eu, como tenho plena consciência do longo caminho que me espera e o qual trilho neste instante, estou em franco processo de EVOLUÇÃO e até mesmo de TRANSMUTAÇÃO, poderia acrescentar. Não a mesma transmutação que faz lagarta virar borboleta, pois não quero dexar de ser EU. Quero continuar lagarta mesmo; viver só por mais 24 horas?!! Tô fora!!! Mas quero ser uma lagarta de bem com a Vida, o Mundo, as pessoas, o meu trabalho, minha família, amigos, colegas, ENFIM, quero aprender todos os dias ser um SER HUMANO melhor para o Mundo a minha volta, mas sobretudo, para MIM MESMA.

O Tempo não para e não deve mesmo parar; e muito menos NÓS. Temos muito ainda para aprender, desenvolver, evoluir... SER.

O TEMPO NÃO PARA

(Cazuza, Arnaldo Brandão)


Disparo contra o sol
Sou forte, sou por acaso
Minha metralhadora cheia de mágoas
Eu sou um cara
Cansado de correr
Na direção contrária
Sem pódio de chegada ou beijo de namorada
Eu sou mais um cara

Mas se você achar
Que eu tô derrotado
Saiba que ainda estão rolando os dados
Porque o tempo, o tempo não pára

Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Eu não tenho data pra comemorar
Às vezes os meus dias são de par em par
Procurando uma agulha num palheiro

Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Post para o FÁBRICA DE LETRAS - Desafio Julho/2010: DISPAROU. Cliquem no link do título e leiam mais textos e poesias com este tema de outros autores.

sábado, 17 de julho de 2010

Ilha das flores - filme curta metragem por Jorge Furtado




O gaúcho Jorge Furtado é diretor de uma das melhores comédias do cinema nacional recente, O Homem Que Copiava, de 2003. Muito antes disso, já era conhecido por uma pequena obra-prima, o premiadíssimo curta-metragem Ilha das Flores – melhor curta em Gramado e Urso de Prata em Berlim. Numa alucinada colagem de imagens, narradas pelo ator Paulo José a partir de um texto de assombrosa objetividade - ainda que por vezes beirando o surreal -, Furtado retrata sucintamente as mazelas da sociedade de consumo.

O senhor Suzuki planta tomates em Porto Alegre. Ele é um bípede, mamífero, possui o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor. É, portanto, um ser humano. Ele vende os tomates no supermercado. Dona Anete, também um ser humano, vende perfumes e, com o dinheiro da venda, compra os tomates do senhor Suzuki e carne de porco para uma refeição da família.

Um dos tomates está estragado e é jogado pela conscienciosa dona Anete no lixo. O refugo vai parar num lixão da capital gaúcha conhecido pelo irônico nome de Ilha das Flores. Nele, um homem compra um terreno e no local cria porcos. Seus funcionários catam no lixo o que pode ser considerado apropriado como alimentação para os porcos. Depois, o dono do terreno deixa entrar aqueles que então poderão escolher a parte que lhes cabe do lixo como alimentação - os seres humanos.

As últimas palavras do roteiro lembram: "O que coloca os seres humanos da Ilha das Flores numa posição posterior aos porcos na prioridade de escolha de materiais orgânicos é o fato de não terem dinheiro nem dono. Os humanos se diferenciam dos outros animais pelo telencéfalo altamente desenvolvido, pelo polegar opositor e por serem livres. Livre é o estado daquele que tem liberdade. Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda."

A Ilha das Flores não é uma ficção. Existe, e fica na margem esquerda do Rio Guaíba, a poucos quilômetros de Porto Alegre, a céu aberto. Assim como existem as circunstâncias descritas por Furtado, que escolheu uma ficção para descrevê-las.

O diretor disse ter entre suas influências no curta o escritor americano Kurt Vonnegut Jr. (um ídolo dos hippies), o diretor francês Alan Resnais (e, em especial, seu filme Meu Tio da América) e a enciclopédia Conhecer. Certamente encontra-se nele, também, a influência do cineasta americano e membro do grupo Monty Python, Terry Gilliam, e suas vinhetas animadas para antológico seriado Flying Circus.

Seja lá de onde for que o telencéfalo de Furtado tirou suas ideias, Ilha das Flores poderia e deveria ser matéria curricular, por registrar de forma didática e engajante uma realidade que, ao final, deixa um gosto amargo e funciona como um poderoso alerta: "gente é pra brilhar, não pra morrer de fome"(Caetano).

Texto de José Eduardo Mendonça

do site http://www.planetasustentavel.abril.com.br/

Verso destacado no texto de autoria de Cecília Meireles


quarta-feira, 14 de julho de 2010

UM ANJO QUER FALAR...


A noite sonha
Eu não acordo
Você desperta em Mim.
Pintura: Adolfo Payés

CARTA DE QUINTANA AO POETA NOVATO


Meu caro poeta,

Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola traçada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!

Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.

A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de ideias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.

Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técninca dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.

Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.

Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?

Mario Quintana

segunda-feira, 12 de julho de 2010

UM AMOR ALUCINADO: Lou Salomé e Rilke



Carta De Rilke a Lou:

Munique, 8 de junho de 1897 Terça- feira

As flores dos campos que trouxe há uma semana de uma manhã maravilhosa há muito estão deitadas entre as grandes folhas de um terno mata-borrão; mas nesta hora em que as contemplo, sorriem-me como uma recordação cheia de graça esforçando-se por parecer alegres como outrora.- Foi uma dessas horas singulares. Horas que são como o coração de uma ilha cingida por densas florescências: para além destas muralhas primaveris, as ondas respiram quase imperceptivelmente, e não se avista um únici barco que venha do passado distante, nem um só que queira continuar para o futuro. O fato de se lhe dever seguir um regresso ao quotidiano não pode esbater estas horas insulares. — Elas permanecem à margem de todas as outras horas, como que vividas ao mais alto nível do ser. Este tipo de existência insular e mais elevada é a meus olhos o futuro de muito poucos.


Uma felicidade toca, floresce ao longe,
Alastra em volta da minha solidão
E procura tecer para os meus sonhos
Um enfeite de ouro.
E ainda que
A minha pobre vida esteja gelada de madrugada
Inquieta e neve dolorosa,
A hora santa virá para ela,
Um dia, da sagrada Primavera......

Desejaria estar já em Dorfen. A cidade é tão ruidosa, estranha. E, nos períodos de maturação interior, nada de estranho deve aflorar as nossas margens. Um dia, daqui a muitos anos, compreenderás completamente tudo o que és para mim. O que é a fonte da montanha para quem está sequioso. E se quem está sequioso é um homem íntegro e agradecido, não vai procurar frescura e força à sua claridade para voltar a partir para o novo sol; sob sua proteção e suficientemente perto para ouvir o seu canto, constrói uma cabana e permanece neste vale pacífico até que os olhos estejam cansados do sol e o seu coração transborde de riqueza e de compreensão. Eu construí cabanas e — permaneço. Minha límpida fonte! Como te estou agradecido. Não quero mais ver flores, céu, sol — a não ser em ti. Tudo é absolutamente mais belo, mais fabuloso, quando o olhas: a flor nas tuas margens, que — sei isso do tempo em que tinha de ver as coisas sem ti — treme de frio no musgo, solitária e terna, reflete-se clara na tua bondade, vibrante, e quase aflora com a sua pequena cabeça o céu que irradia da tua profundeza. E o raio de sol que chega empoeirado e único aos teus limites transfigura-se e multiplica-se em chuva de centelhas nas ondas luminosas da tua alma. Minha límpida fonte. É através de ti que quero ver o mundo, porque, ao mesmo tempo, verei, já não o mundo, mas apenas a ti, a ti, a ti! Tu és o meu dia de festa. Quando em sonhos me junto a ti, tenho sempre flores nos cabelos. Desejaria colocar-te flores nos cabelos. Quais? Nenhuma tem a simplicidade comovente que deveria, nenhuma é suficientemente simples. Em que Maio colhê-las? — Mas creio agora que tens sempre nos cabelos uma grinalda — ou uma coroa... Nunca te vi de outro modo.
Nunca te vi, que não tivesse o desejo de te rezar. Nunca te ouvi, que não tivesse o desejo de acreditar em ti. Nunca te esperei, sem o desejo de sofrer por ti. Nunca te desejei, sem ter também o direito de me ajoelhar à tua frente. Sou para ti como o bastão para o caminhante, mas sem te apoiara. Sou para ti como o cetro é para o rei, mas sem te enriquecer. Sou para ti como a última pequena estrela é para a noite, ainda que a noite mal a distinguisse e ignorasse a sua cintilação.

René


Do livro: "Correspondência Amorosa", Rainer Maria Rilke e Lou Andreas-Salomé, trad. Manuel Alberto, Relógio D'Água Editores,1994, Lisboa.
Na primeira foto: um poema de RILKE para LOU.

Há alguém aí?!!!


Sinto-me uma mistura saturada de mim mesma.

E nem sei direito o que há aqui dentro;
parece, às vezes, uma aglutinação de nada
com coisa nenhuma.

Vácuo. Lacuna.

Uma palavra esquecida no Mundo.
Latim arcaico
Língua morta
Não renovou-se
perdeu a hora
Afugentou-se!
Está agora só de partida
E Pra Lugar Algum.

Lou Albergaria

domingo, 11 de julho de 2010

DISPAROU A CORRER PELA VIDA...




Quando ItálicoTom Hanks disparou a correr no filme Forrest Gump porque se sentia tão triste e desesperançado logo após uma decepção amorosa e, ao longo do percurso, foi arregimentando pessoas que começaram a acompanhá-lo sem nem ao menos saber o porquê. Apenas seguiam seu instinto, seu impulso, o desejo de quebrar a rotina, quebrar o tudo sempre igual.

E quanto mais corria e atravessava um estado inteiro, ele que sempre fora tão só toda sua vida, começou a atrair pessoas para junto de si.
Em minha opinião, um dos melhores filmes do Tom Hancks, pois trata da fragilidade humana e de como somos miseravelmente condenados, muitas vezes, por nós mesmos a viver uma vida miserável (emocionalmente falando) por um mecanismo de auto-punição e auto-penitência, que na maioria das vezes nos mutila e paralisa.

O nosso potencial humano e intelectual poderia fazer-nos disparar em conquistas e sucesso, mas algo inexplicável nos freia, nos poda; funciona como um muro ao qual não conseguimos transpor.

Particularmente, sou fascinada por este personagem, Forrest Gump, pois ele é absolutamente genial, com um elevadíssimo potencial de inteligência e sensibilidade, mas faz coisas consideradas tão imbecis no cotidiano, que as pessoas infinitamente menos inteligentes e geniais do que ele o tratam como um boçal, pois sempre que aparece a oportunidade em sua vida de disparar e avançar por sobre o muro, "acontece" algo que o retrai, tolhe seu potencial e ele, como de costume, deixa escapar o instante do vôo e torna-se um refém do muro e, pior, de si mesmo, quando o medo de fracassar apresenta-se mais forte que a vontade de superação; o medo de se mostrar "um idiota" perante à sociedade acaba fazendo com que ele acredite que é esse idiota. Então, nesse momento do filme, começa a agir deliberadamente como um, se auto-sabotando o tempo inteiro, consciente ou inconscientemente.

Quantas e quantas vezes também não nos auto-punimos dessa forma tão deplorável ao agir não como verdadeiramente somos, mas como pensam e acreditam que somos?

Consideram-nos idiotas, malandros, preguiçosos, arrogantes, sem o menor talento para coisa alguma, então vamos nos enquadrar, vamos introjetar isso; não podemos de forma alguma surpreendê-los, ir contra às expectativas que possuem acerca de nós. E nem mesmo conseguimos mostrar a nós mesmos que podemos nos surpreender, fazer algo inusitado, fora do que estamos tão acostumados a viver (ou não viver).

Viver faz disparar a Alma! Ou é o oposto? Quando sentimos nossa alma, aí é que conseguimos fazer nossa vida disparar para o sentido do que verdadeiramente SOMOS e, mesmo contrariando todas as expectativas, aprendemos e constatamos que nossa "caixa de chocolates" está repleta de infinitas e saborosas possibilidades e, não, VAZIA de nós mesmos.

Dê uma chance a você! Tente abrir a sua "caixa de chocolates", pelo menos para ver o que pode encontrar lá dentro. Não acredite logo de cara no que lhe dizem desde quando nasceu.

Olha que você pode se surpreender. E muito! Afinal de contas, como dizia Forrest: "a vida é como uma caixa de chocolates, você nunca sabe o que vai encontrar..."



Texto elaborado especialmente para o FÁBRICA DE LETRAS para o DESAFIO de JULHO/2010. Cliquem no link do título para apreciarem os demais textos e poesias com o tema DISPAROU.

A MENINA DAS TRANCINHAS


Este poema foi inspirado por uma menina de no máximo três anos que passou por mim, à hora do almoço, de um desses dias qualquer, em uma rua próxima ao meu trabalho, na região central de Belo Horizonte. O poema escorreu de mim imediatamente ao vislumbrar suas encantadoras trancinhas e seu jeitinho de andar com uma das mãos segurando a cintura...


Menininha,

troca uma trancinha por um verso?


- É claro que não, poetinha louca!
Minha trancinha é de verdade
guardada pela inocência
protegida pela esperança,
enquanto seu verso é de mentira
carrega muito mais passado que futuro
até o nunca que jamais aconteceu.

Ele vive na realidade do sonho

naquilo que quase ninguém quer mais
imaginar, nem saber.

Eu não imagino Nada pois eu vivo Tudo.

Meu passado de tão pequeno
é mais leve que uma pluma.
E futuro na minha idade
também não pesa
pois nem sequer me pertence.

Não possuir concede liberdade
de Ser, Estar e Existir.

Você, poetinha, está condenada
por seus versos
a viver entre vários Mundos.

Por isso, não se encontra em nenhum deles.

Eu, ao contrário,
só tenho a infância como Mundo
Encontro, então, abrigo
ternura, aconchego.

Eu posso tudo!

Só preciso brincar de acreditar
No que você não consegue mais...

É isso que dá querer Saber Tudo!

Aprende, poetinha, com essa menina que hoje te usa:

A gente só deve saber o suficiente
que não nos deixe perder a Fé.


Foto: Minha filha Isadora com 3 anos